quinta-feira, abril 26, 2018

Agência

Só observo.
Paro, apoio os braços no cabo do meu rodinho e observo.
Gente que entra, gente que sai.
Esta é a vida: pagar contas, sacar notas, tomar emprestado e não conseguir quitar.
Nomes mais sujos que a sola de seus sapatos.
Que mancham o chão que todo dia limpo.
Não reclamo. É meu ofício.

Lá vem uma senhora. Não notou o aviso:
"Cuidado, piso molhado".
Quanta benção. Chegou sã e salva ao caixa preferencial.
Deus protege os aposentados.
Ou eu que joguei pouco sabão. Hmmm...

Meu rodinho é minha arma.
Contra os germes e os seres humanos.
Esfrego e me calo, aguardando a ação dos produtos químicos.
Borbulham na superfície do laminado, eu noto -- e mais ninguém.
Em alguns metros quadrados há pureza nesta Terra.
Graças a mim.

Chega o fim do expediente.
Sou eu quem apaga a luz.
Me despeço do vigia e dos valores.
Gostam, ambos, da escuridão.
Até, notas. Até, servidor. Não tome um tiro por nós hoje.

Minhas botas não entram em casa.
A sujeira, porém, vem pela TV.
Notícias dum mundo velho, que cansou de girar em si.
Só observo, apenas observo. Sem sentir.
O sono vem, hora de dormir.

Amanhã tudo se repete.

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